Paulo Murilo
No momento do Maithuna (encontro Shiva/Shakti) quando acontece a liberação do sêmen e a fertilização do óvulo, neste precioso e belo momento surge Bala (a criança), a semente, que precisa de determinado tempo, de certa quantidade de evolução antes que possa sair deste mesmo ciclo evolutivo. Podemos dizer que o ser precisa sedimentar a noção do eu (Ahankara), antes que possa chegar ao “não eu” (Atma), sua natureza primordial, eterna, sem-forma, anterior ao mundo da evolução, mas não diferente dele.
Não alcançamos esse estado tendo somente algum tipo de experiência (Samadhi), mas sim, ao contrário, saindo completamente do círculo do tempo, e entrando na própria Eternidade que, na verdade, é o reconhecimento do seu próprio “EU” (Atma) que existia antes do (Maithuna). Eternamente brilhante neste e em todos os momentos, pleno, além do tempo e do espaço e ainda assim abrangendo todo o tempo e todo espaço.
Na visão Tantrica, existe, apenas e somente, a Consciência, Shiva, em todo o seu maravilhoso esplendor. Tudo, todo o bem e todo o mal, o certo e o errado, o feio e o bonito, cada um e todos eles são a manifestação perfeita de Shiva, sem acrescentar ou tirar algo, assim mesmo como são.
Não existe nada a não ser Shiva, a Consciência.
Com esse entendimento se desfaz a compreensão da “noção do eu” (Ahankara) que constantemente nos impele a uma busca desenfreada, levando-nos a uma sensação de apego, de desejo, de ansiar, de evitar, de resistir, uma sensação de busca constante e interminável. Procuramos passar de um estado de ignorância para o estado de conhecimento, de não-iluminado para iluminado, esquecendo-nos que não há lugar algum ondeShiva, a Consciência, não esteja; por isso, qualquer busca, qualquer experiência, é inútil e apenas reforça a errada suposição de que existe algum lugar em que Shiva não está porque não existe espaço algum em que Ele não esteja.
Existe apenas e somente Ele, Shiva.
Podemos afirmar que a busca pela auto-realização acaba impedindo a própria realização, pois quando se busca alguma coisa, pressupõe-se uma perda, algo que está fora, algo que será algum dia encontrado ou alcançado e, com isso, acabamos empurrando para longe o que existe no eterno agora.
Isso não quer dizer que os Tantras neguem os estados mais elevados, as experiências de Samadhi, eles não o fazem. Existem muitas práticas que ajudam os buscadores a atingir esses estados alterados de consciência. Mas, ao mesmo tempo, afirma que esses estados, que têm um começo e um fim, não têm afinal nada a ver com a eternidade, o conhecimento. A meta é a ausência desses estados de experiência e não uma fascinação por esses estados.
Devemos ter sempre em mente que a realidade máxima não é algo a ser visto, sentido ou alcançado, mas em vez disto, a realidade é o observador sempre presente.
Não é demais, neste momento, lembrar a afirmação de Shri Nisargadata Maharaj: “O buscador é o buscado”.